Com os ajustes na articulação política promovidos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o governo afinou a relação com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), mas não reverteu o clima de insatisfação que permeia o entorno do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). A expectativa é que nesta semana Lula e o mineiro se reúnam para tratar das dificuldades na Casa.
Três temas devem entrar na agenda entre Pacheco e Lula: a manutenção ou derrubada do veto presidencial a dispositivo da lei orçamentária que prevê R$ 5,6 bilhões para emendas de comissão; a reestruturação da dívida de Minas Gerais que foi federalizada e a tramitação da PEC dos Quinquênios, medida para beneficiar integrantes do Judiciário, com grande impacto federal.
O clima entre Pacheco e o Planalto se deteriorou na semana passada em função da iniciativa da Advocacia Geral da União (AGU) de pedir ao Supremo Tribunal Federal a suspensão da lei que desonera a folha de municípios e dos 17 setores que mais empregam. Em notas na sexta e no sábado, Pacheco afirmou que o governo “erra em judicializar a Política”.
No domingo 21, Lula recebeu Lira no Palácio da Alvorada, e puxou para si as rédeas da articulação. O gesto ao presidente da Câmara incomodou aliados de Pacheco, já que a semana transcorreu sem que o encontro com o senador mineiro fosse agendado.
A percepção de auxiliares presidenciais e de lideranças governistas é de que a relação de disputa velada entre Lira e Pacheco acaba resvalando no governo. O cenário agrava-se diante da fragmentação da articulação política, já que o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, é interlocutor de primeira hora de Pacheco, enquanto Lula teve de designar o chefe da Casa Civil, Rui Costa, para dialogar com Lira.
Na semana passada, o principal impasse entre as duas Casas era a divisão dos R$ 3,6 bilhões que o governo destinou para os parlamentares. O repasse desse valor fez parte de acordo para evitar a derrubada do veto presidencial a R$ 5,6 bilhões de emendas de comissão previstos na lei orçamentária de 2024.
Na quinta-feira, o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), anunciou que 1/3 dessa quantia (R$ 1,2 bilhão) iria para os senadores, e 2/3 (R$ 2,4 bilhões) para os deputados. Contudo, segundo uma fonte palaciana, em uma reunião com a participação de ministros e a presença do presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), no mesmo dia, outros valores foram colocados sobre a mesa: seriam R$ 1,9 bilhão para os senadores e R$ 1,7 bilhão para os deputados.
Os recursos sairão de uma folga orçamentária de R$ 15 bilhões viabilizada pelo aumento da arrecadação, e embutida em dispositivos do projeto de lei de recriação do seguro obrigatório Dpvat. Já aprovada na Câmara, a matéria deve ser votada no Senado nesta terça-feira (30).
A tensão entre Senado e Câmara aumentou após uma reunião de Lula com ministros e líderes da articulação política no dia 19. Trechos vazados mostram que a conduta de Pacheco teria sido questionada por ele ter impulsionado a proposta de emenda constitucional que resgata o quinquênio, pago a juízes, Ministério Público e outras carreiras. O rombo estimado é de R$ 40 bilhões na esfera federal, com possível efeito cascata sobre Estados e municípios. Os rumores eram de que as críticas teriam partido de Rui Costa, que negou com veemência.
Esse ambiente de intrigas foi o pano de fundo para declarações de Pacheco na sexta-feira, quando ele classificou como “catastrófica” a ação da Advocacia-Geral da União (AGU) junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) para suspender a prorrogação da desoneração da folha.
Aliados de Pacheco relembram que ele sempre teve uma postura de responsabilidade com o governo e com a defesa da democracia. No ato para relembrar um ano da tentativa de golpe de Estado, esteve ao lado de Lula e dos ministros do STF, enquanto Lira se ausentou. Os mesmos interlocutores ponderam que ele adiou por duas vezes a pedido do Planalto a sessão do Congresso para analisar vetos – agora remarcada para 9 de maio.
Questionado sobre a PEC dos quinquênios, Pacheco alegou que ela só será promulgada se avançar, concomitantemente, o projeto que põe fim aos supersalários. Mas depende dele a tramitação desta matéria, que voltou da Câmara em 2021, e há três anos aguarda designação de relator no Senado.
Um interlocutor de Pacheco observa que o presidente do Senado aguarda, desde dezembro, encaminhamentos do Ministério da Fazenda sobre as dívidas dos Estados. Ele se tornou interlocutor dos governadores para essa questão, e obteve de Lula o aval para mediar, especialmente, a dívida de Minas.
Num momento em que o próprio Lula o apresenta como seu candidato ao governo mineiro em 2026, solucionar a dívida de Minas com a União seria um feito que o credenciaria. Mas ele depende de uma construção com Haddad para redigir o texto do projeto e colocá-lo para tramitar no Senado.
Embora seja tratado como “aliado” pelos ministros de Lula, Pacheco não recebeu convite para o evento de sexta-feira (26) em Nova Lima, na grande Belo Horizonte (MG) – a inauguração da fábrica de medicamentos da Bioom -, que contou com o presidente, ministros e parlamentares. Único mineiro no primeiro escalão e aliado próximos de Pacheco, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, esteve no ato.