O governo federal conta com o programa Juros por Educação – que propõe reduzir os juros da dívida cobrada dos Estados em troca da ampliação das matrículas no ensino médio técnico – para expandir essa política pública e elevar o Brasil ao patamar das economias mais desenvolvidas que integram a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Na visão de autoridades do Executivo e especialistas em educação, essa seria uma saída inovadora com potencial impacto positivo na produtividade, combate à evasão escolar e qualificação da mão de obra nacional. Por outro lado, governos estaduais ainda aguardam detalhes da proposta, que terá de passar pelo Congresso.
“Precisamos de recursos para induzir essa política, então aproveitar a redução dos juros dos Estados para buscar elevar o país a patamares da OCDE é fundamental, são ganhos sociais e econômicos importantes para o Brasil e para os Estados brasileiros”, afirmou o ministro da Educação, Camilo Santana, durante evento organizado pelo Valor em parceria com Itaú Educação e Trabalho e Todos Pela Educação
Ele destacou que o governo Lula quer chegar até 2026 com mil institutos técnicos federais, mas que, mesmo com a expansão, não será suficiente para que cada Estado do país tenha 37% dos alunos do ensino médio matriculados em escolas técnicas ou realizando cursos equivalentes de forma concomitante. Essa é uma meta que foi estabelecida pelo Ministério da Educação (MEC).
“É preciso ter um esforço coletivo dos Estados para a gente garantir um avanço mais rápido do ensino técnico no Brasil”, disse Santana, ressaltando a importância da qualificação dos jovens para a produtividade e para o crescimento da economia brasileira. O ministro frisou, ainda, que o governo federal apenas define as políticas públicas, mas são os Estados e os municípios os responsáveis por grande parte da execução.
Atualmente, as dívidas dos Estados com a União são corrigidas pela inflação mais 4% ao ano ou pela Selic, o que for mais vantajoso. O programa propõe uma redução para juros real de até 2% ao ano para os Estados que expandirem as matrículas no ensino médio técnico de 2025 a 2030. O dinheiro que deverá ser usado na expansão é o que será economizado com o serviço da dívida.
Para os Estados que aplicarem ao menos 50% da economia na criação e ampliação de matrículas, a taxa de juros será de 3% ao ano mais inflação. Ao aderir à faixa que dá juros reais de 2,5% a.a, o ente federado precisa aplicar ao menos 75% da economia no ensino técnico. Já a faixa com os juros mais baixos (2% a.a + IPCA) exige investimento integral.
O programa foi apresentado pelo Executivo aos governadores e está agora na fase de negociação antes de ser proposto formalmente por projeto de lei ao Congresso. O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, afirmou no evento que a proposta é uma ideia aberta a aprimoramentos. Também destacou a importância do diálogo federativo para avançar na agenda. “O diálogo federativo tem sido reforçado”, afirmou, acrescentando que o presidente Lula tem chamado governadores de diversas orientações ideológicas para pensar o Estado. “Esse é o caminho que vamos seguir adotando até o fim do governo.”
Segundo ele, a proposta é uma alternativa inovadora à discussão jurídica sobre o assunto. “Os Estados já estavam judicializando o tema na Suprema Corte, mas não queremos discutir ad aeternum a taxa de juros que a pagar. Por que não apostar no novo, num caminho que a gente quer para desenvolvimento do país?”, afirmou o secretário.
Durigan também disse que a dívida dos Estados é tema recorrente e que reaparece agora com a tragédia climática vista no Rio Grande do Sul – um dos entes com o maior saldo devedor. Ele afirmou que será dada resposta específica para a dívida do Estado, que teve mais de 300 cidades atingidas pelas enchentes.
O saldo devedor dos Estados atinge a cifra de R$ 740 bilhões, segundo números do Ministério da Fazenda. Do total, quatro Estados – São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais – representam R$ 660 bilhões, o equivalente a 90% do estoque da dívida.
Já o governador da Paraíba, João Azevêdo (PSB), afirmou durante o debate que o programa não pode privilegiar apenas Estados que têm dívidas maiores em detrimento daqueles com menor débito. “É preciso um pouco mais para os Estados que fizeram seus deveres de casa. Porque pelo programa, para os Estados que não têm dívida ou que têm dívidas pequenas, será permitido apenas uma agilização dos empréstimos concedidos”, disse o governador.
Ele defendeu que o governo federal faça uma análise da demanda individual de cada Estado, pois além daqueles com as finanças em ordem, há ainda entes federativos que já investem bastante no ensino técnico.
Durigan acrescentou que “nenhum Estado vai ser deixado para trás” no programa. “Estudamos uma linha de financiamento especial para os que tenham menos dívida. O benefício vai ser menor, porque a dívida é menor, mas vão ser abertas outras frentes de trabalho.”
Há alguns Estados, por exemplo, que defendem usar a economia que será gerada com a redução de juros para investir em infraestrutura de saneamento. O secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, um dos idealizadores do programa, disse que, caso uma proposta dessa avance, o governo teria de pensar em alguma outra regra ou trava para garantir que a economia com os juros seja usada mesmo para investimento, e não para outros fins.
Ceron pontou que, com a expansão do aporte federal no Fundeb (o fundo da educação), os Estados vão conseguir absorver o custo do incremento da rede de educação técnica. “Nós não vamos impulsionar despesas correntes que, depois, não vão poder ser suportadas”, destacou.
O secretário executivo-adjunto do Ministério da Educação (MEC), Gregório Grisa, rebateu as críticas de que o programa servirá para “premiar” Estados endividados. Segundo ele, isso decorre de um raciocínio “muito singelo”, que também rendeu questionamentos semelhantes na época do lançamento do ProUni.
“Em relação às grandes dívidas [dos Estados], a lógica do litígio não tem dado certo, porque os Estados encontram alternativas políticas dentro do Congresso e dentro do Supremo para, de alguma forma, ou se isentar, ou suspender, ou ter uma alternativa de não pagamento”, disse Grisa. “Como se trata de um recurso que, a grosso modo, não virá, faz todo o sentido você endereçar para uma pauta nobre que, no médio e longo prazos, vai potencializar a saúde financeira daquele Estado.”
O secretário também defendeu que programas de formação técnica olhem para as “vocações” de cada Estado. Segundo ele, há demandas locais relacionadas à preservação do meio ambiente que não estavam mapeadas há dez ou há 20 anos, e que hoje oferecem oportunidade de emprego para quem se especializou na área. Sobre a dinâmica do mercado, disse que o curso técnico deve respeitar a dinâmica do “eixo tecnológico”.