Cerca de 25% da população total investiu na caderneta de poupança em 2023Divulgação
A caderneta de poupança sempre foi muito utilizada pelos brasileiros. Na prática, ela normalmente é o primeiro contato da maioria das pessoas com as aplicações disponíveis no mercado financeiro. Segundo dados Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), cerca de 25% da população total investiu no instrumento em 2023. Considerando apenas a população investidora, esse percentual é de 68%.
Apesar da sua adesão, um levantamento do Banco Central (BC) aponta que as retiradas superaram as aplicações nos últimos anos. Por isso, especialistas ouvidos por O DIA explicam se ainda vale a pena apostar nessa modalidade de investimento.
Embora existam outras opções mais rentáveis dentro do segmento de renda fixa, a caderneta de poupança é muito utilizada por conta de sua praticidade, segurança e liquidez, o que fez com que ela se tornasse bastante popular no Brasil.
“Mesmo sendo o ‘investimento’ de renda fixa de menor rentabilidade, ainda é considerada uma boa opção por oferecer segurança e liquidez imediata. Ou seja, é um investimento de baixo risco, e o valor investido e sua rentabilidade podem ser resgatados a qualquer momento”, explica Camila Lima, administradora, mestre em economia e professora da Faculdade de Educação Tecnológica do Rio de Janeiro (Faeterj).
Por ser simples e bastante acessível, a caderneta “caiu nas graças” de grande parte da população, sendo possível até mesmo abrir uma conta para menores de idade, desde que autorizado e acompanhado pelos pais ou responsáveis legais.
Bia Santos, educadora financeira e CEO da Barkus, startup de educação e inclusão financeira, explica que o rendimento da poupança está atrelado à taxa básica de juros da economia, a Selic. Se a Selic estiver igual ou abaixo de 8,5% ao ano, a poupança rende 70% da Selic + Taxa Referencial (TR). Caso a Selic esteja acima de 8,5% ao ano, a poupança rende 0,5% ao mês sobre o valor depositado + TR.
“Vamos a exemplos do histórico recente. Até o fim de 2020, quando a Selic estava em 7,75% ao ano, o rendimento da poupança era equivalente a 70% da taxa de juros, apresentando o pior rendimento desde o início do Plano Real: 2,11%. Porém, no fim de 2021, o Copom [Comitê de Política Monetária] do Banco Central elevou a taxa Selic para 9,25% ao ano e, com isso, houve uma mudança na regra de rendimento da poupança. Por isso, em 2021, o rendimento bruto foi de, aproximadamente, 8%”, detalha a especialista.
Recentemente, o Copom reduziu pela sétima vez consecutiva a Selic. No entanto, a velocidade dos cortes diminuiu. De agosto do ano passado até março deste ano, o comitê tinha reduzido os juros básicos em 0,5 ponto percentual a cada reunião. Dessa vez, a redução foi de 0,25 ponto percentual, levando a Selic para 10,5% ao ano.
“Caso a taxa Selic continue caindo e fique abaixo de 8,5%, os rendimentos da poupança também vão diminuir consideravelmente, tornando-a menos atrativa em comparação com outros investimentos que oferecem maiores retornos”, acrescenta Santos.
Para Camila Lima, mestre em economia, após a última queda da taxa Selic, a poupança se consolidou como a pior opção de investimento em termos de rendimentos.
“Em termos práticos, se uma pessoa investir R$ 1.000 na poupança, após 12 meses terá um rendimento de aproximadamente R$ 61, totalizando R$ 1.061. Em dois anos, poderá alcançar aproximadamente R$ 1.126”, explica Camila Lima, mestre em economia.
A caderneta de poupança é isenta de taxas ou qualquer despesa, de modo que essa cobrança é proibida por lei. Por conta disso, não é permitido que os bancos cobrem tarifas de manutenção, administração ou de performance ao cliente. Os rendimentos são isentos de Imposto de Renda para pessoas físicas.
“Não é necessário declarar os rendimentos da poupança no Imposto de Renda, pois eles não são tributados. Por isso, ela sempre foi tão atraente para os investidores mais conservadores, além da facilidade de abertura da conta poupança”, aponta a educadora financeira Bia Santos.
Saques superam aplicações
Dados do Banco Central retratam que desde 2021, a captação líquida tem sido negativa, com saques superando os depósitos em R$ 35,5 bilhões naquele ano. Em 2022, o resultado foi negativo em R$ 103,2 bilhões e, em 2023, foi de R$ 87,8 bilhões. Até o final de fevereiro de 2024, já houve uma fuga de R$ 24 bilhões da poupança.
Em abril, foram aplicados na poupança R$ 353,973 bilhões, enquanto R$ 355,115 bilhões foram sacados pelos brasileiros. Considerando o rendimento de R$ 5,199 bilhões, o saldo total da caderneta somou R$ 979,827 bilhões ao fim de janeiro.
No acumulado do ano até abril, a poupança acumula um saque líquido de R$ 23,775 bilhões, muito impactado pela retirada de R$ 20,148 bilhões em janeiro.
Apesar desses números, as especialistas acreditam que ainda não é possível prever o fim da poupança, pois o volume total de depósitos nesse investimento continua alto.
“Embora existam discussões sobre mudanças nas regras da poupança, como a forma de cálculo dos rendimentos, é improvável que a modalidade seja extinta nos próximos anos, pois ainda é amplamente utilizada pela população brasileira”, afirma Bia Santos.
“Embora haja outras opções no mercado, a poupança ainda é considerada por parte da população como uma forma de guardar dinheiro. Para quem tem maior contato com investimentos, naturalmente deixa de ser uma opção devido à sua baixa rentabilidade”, ressalta Camila Lima.
A vendedora Michelle Vieira, de 35 anos, conta que tem buscado conhecer mais sobre o mercado financeiro. Pensando no futuro da filha adolescente, ainda acredita que deixar um dinheirinho guardado é a melhor opção para ajudá-la.
“Desde que a Renata tinha 10 anos eu guardo um dinheirinho na poupança. Hoje está no meu nome, mas eu já fui no banco saber como posso fazer para colocar no nome dela. Os meus pais não puderam fazer isso por mim, então fico feliz em saber que estou contribuindo por um futuro com mais segurança financeira para ela”, comemora.
“Eu atendo diferentes tipos de pessoas e profissionais onde trabalho. Escuto sempre que estou perdendo tempo em guardar dinheiro na poupança, que isso já ficou para trás e que tenho que investir em outras modalidades. Tenho pesquisado bastante e gostado do que tenho aprendido sobre o assunto. Só não quero meter os pés pelas mãos”, diz Vieira. “Cada centavo é importante. É fruto de muito suor”, acrescenta.
Imobiliário
Uma das mais tradicionais fontes de recursos para financiamentos de imóveis para a classe média com juros limitados, o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) é afetado pela retirada de recursos da caderneta de poupança.
Atualmente, os bancos são obrigados a destinar 65% dos depósitos da poupança ao SBPE. Esse sistema cobre até 80% de imóveis de até R$ 1,5 milhão, com juros limitados a 12% ao ano, o teto do Sistema Financeiro da Habitação (SFH). A modalidade tem risco historicamente baixo de inadimplência porque as prestações são limitadas a 30% da renda do mutuário, e os financiamentos duram até 35 anos.
A CBIC ainda não tem projeções para essa modalidade em 2024. No fim do ano passado, a entidade informou apenas que acredita em uma recuperação no SBPE no segundo semestre e que o número de lançamentos será ao menos igual ao de 2023.
Já a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) prevê que o volume de crédito no sistema fique estável em relação ao ano passado, afetado tanto pela retirada de recursos da poupança como pelos juros ainda altos.
Em nota ao O DIA, a Caixa Econômica Federal aponta que espera um crescimento entre 8% e 12% na carteira habitacional em 2024.
“A Caixa segue contratando também em linhas de crédito com recursos do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), o qual ampliou a oferta de recursos para os agentes financeiros em 2023 e 2024, o que contribui para a disponibilidade para o crédito imobiliário. Em 2024, esperamos um crescimento entre 8% e 12% na carteira habitacional.”
Conheça outros tipos de investimentos
– Certificado de Depósito Bancário (CDB): são títulos de renda fixa emitidos por bancos para captar recursos. Em troca, o investidor recebe o dinheiro investido de volta, corrigido e com acréscimo de uma taxa de juros.
– Tesouro Direto: é como emprestar dinheiro ao governo federal para financiar investimentos no país. Em troca, o investidor recebe o dinheiro emprestado de volta, corrigido com acréscimo de um percentual de juros.
– Letras de Crédito Imobiliário(LCI) e Letras de Crédito do Agronegócio (LCA): são títulos de renda fixa emitidos por bancos para financiar atividades nos setores imobiliário e agrícola, respectivamente. Esses investimentos são protegidos pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC) e são isentos de imposto de renda.
– Fundo de Renda Fixa: captam recursos de investidores através da venda de cotas. O gestor do fundo aplica esses recursos em uma carteira diversificada de ativos de renda fixa, como CDBs e títulos do Tesouro Direto.
“Esses investimentos podem oferecer rendimentos maiores do que a poupança, mas é importante avaliar o perfil de risco e prazo de investimento antes de escolher a melhor opção. Para quem está começando, a dica é iniciar com investimentos de renda fixa, mais seguros e com rendimentos previsíveis”, conclui Bia Santos, educadora financeira e CEO da Barkus.
Dicas para fazer o seu dinheiro render mais
– Saiba qual é o seu perfil de investidor;
– Estude todos os dias;
– Tenha um planejamento;
– Crie objetivos;
– Cuidado com as taxas cobradas;
– Invista em outros países;
– Procure ajuda profissional;
– Leve em consideração o valor do dinheiro no tempo;