Em um cenário marcado por obstáculos que vão desde rixas internas até questões de saúde, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), trabalha para manter e ampliar o controle de prefeituras em Alagoas nas eleições municipais deste ano. A família de Lira está diretamente envolvida nas disputas de seis cidades; em todas, o MDB, do senador Renan Calheiros, lançou candidatos com o objetivo de derrotar o grupo político do deputado, seu desafeto.
- Barbie, Pixar, Xena: memes com uso de Inteligência Artificial motivam ações na Justiça Eleitoral
- ‘Bola fora’: Senador petista segue bolsonaristas e também critica releitura da ‘Última Ceia’ na Olimpíada
A disputa mais delicada para Lira é em Barra de São Miguel, pequeno município litorâneo de oito mil habitantes, a meia hora da capital Maceió. Candidato à reeleição, o prefeito Benedito de Lira (PP), pai do presidente da Câmara, tem como adversário justamente seu atual vice, Floriano Melo, que se filiou ao MDB no ano passado a convite de Renan.
Aos 82 anos, Biu, como o pai de Lira é conhecido, recebeu da imprensa local o rótulo de “candidato mais idoso” do estado. Ele chegou à convenção que oficializou sua candidatura, no último sábado, caminhando ao lado do filho com auxílio de uma muleta. Nos eventos de campanha, Biu tem exibido dificuldade para fazer uma dancinha com passos de forró, sua marca registrada em eleições anteriores.
A situação fez com que Biu fosse apelidado por seguidores nas redes sociais de “Joe Biden alagoano”, em referência ao presidente dos Estados Unidos, que desistiu de concorrer à reeleição após questionamentos à sua aptidão física. Interlocutores da família afirmam que Lira, embora apoie a reeleição do pai, tem mostrado preocupação devido à idade avançada. Procurado, o presidente da Câmara não respondeu.
Em contato com o GLOBO na quinta-feira, após ser informado do motivo da ligação, Biu alegou que estava em uma estrada onde o sinal “não é confiável”. Em novo telefonema no dia seguinte, o prefeito declarou que estava “no laboratório fazendo exame de sangue”, encerrou a chamada e não voltou a atender os contatos.
Concorrente da família Lira em Barra de São Miguel, Floriano Melo foi assessor parlamentar de Biu no Senado por quase toda a década passada e também trabalhou no gabinete de Arthur na Câmara. A relação entre prefeito e vice desandou quando Floriano, que acumulava o cargo de secretário municipal de Governo, foi demitido para dar lugar ao advogado Henrique Alves Pinto — que acabou sendo indicado à vaga de vice na chapa de Biu neste ano.
Vigilância do neto
O advogado é historicamente ligado ao vereador de Maceió Marcelo Palmeira (PL), filho da primeira-dama de Barra de São Miguel, Tereza Palmeira. A influência exercida pela família de Tereza, madrasta de Lira, sobre a prefeitura não passou despercebida pelo presidente da Câmara. Um dos filhos de Lira, Álvaro, de 19 anos, passou a acompanhar o avô sistematicamente em reuniões da pré-campanha, como um nome de confiança do pai. Conhecido como Alvinho, ele chegou a ser cotado como vice de Biu, mas a legislação exige idade mínima de 21 anos.
Segundo Floriano, atual vice e hoje adversário, um dos motes de sua campanha é reduzir o peso de “pessoas de fora da cidade” na gestão.
— Temos uma amizade de 15 anos e nunca briguei com Biu, ele é que deixou de me receber. Mas sempre fui uma pedra no sapato da família Palmeira. As pessoas comentam que, devido aos problemas de saúde, Barra ficou sem comandante — diz Floriano.
O clã Lira também chega rachado na eleição de Maragogi, no litoral norte do estado, onde o atual prefeito Sérgio Lira indicou o vereador Dani da Elba (PP) para concorrer à sucessão. A decisão desagradou a César Lira, primo de Sérgio e do presidente da Câmara, que esperava concorrer. César foi superintendente do Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em Alagoas até abril deste ano, apadrinhado por Lira.
Ex-prefeito de Maragogi e rival da atual gestão, Marcos Madeira (MDB) vem sondando o apoio de César. Ambos já apareceram lado a lado em eventos na cidade.
— César tem relevância na zona rural, é um apoiador importante. Ele queria ser candidato, e Arthur também queria que fosse, mas o prefeito queimou essa candidatura — afirma Madeira.
Clã pereira
No lado materno da família, Lira apoiará três primos, todos do PP, em municípios limítrofes que são seu reduto histórico: Pauline Pereira, em Campo Alegre; Joãozinho Pereira, em Junqueiro; e Peu Pereira, candidato à reeleição em Teotônio Vilela. Pauline, que já foi prefeita de 2013 a 2020, é uma das principais apostas do presidente da Câmara; o atual prefeito, Nicolas Pereira, outro primo, abdicou de ir à reeleição para apoiá-la.
Já a campanha de Joãozinho aposta na divulgação de obras realizadas pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba (Codevasf) sob sua gestão como superintendente em Alagoas. Na região rural de Junqueiro, uma obra de pavimentação feita com recurso de emendas indicadas por Lira, de R$ 1,1 milhão, virou palanque para Joãozinho, que prometeu entregar “muito mais” na cidade. Como O GLOBO revelou no ano passado, a obra usou tratores de uma empresa da família de Lira, que não aparecia no contrato da Codevasf.
Rivais ferrenhos, Joãozinho e o atual prefeito de Junqueiro, Leandro Silva (MDB), fazem uma pré-campanha marcada por ataques nas redes sociais e processos na Justiça Eleitoral. Em reação à candidatura de Joãozinho, o prefeito de Junqueiro lançou seu irmão, Valdir Silva (MDB), para concorrer contra Peu Pereira na cidade vizinha.
Outro primo de Lira atrás de novo mandato neste ano é Teófilo José Pereira (PP), atual prefeito de Craíbas. Um de seus concorrentes é o ex-prefeito Ediel Leite (MDB).