Segundo o presidente do CNE, Elvis Amoroso, Maduro obteve 51,2% dos votos, contra 44,2% do opositor Edmundo González, com 80% das urnas apuradas.
O anúncio aconteceu pouco depois da meia-noite em Caracas (1h em Brasília). Amoroso, um aliado de Maduro, disse que a tendência da apuração era “contundente e irreversível”.
O presidente do CNE também disse que o país investigará “ataques terroristas” ao sistema eleitoral aos quais atribuiu o atraso na divulgação.
Nas horas de espera, o país mergulhou em tensão, com a oposição denunciando supostas irregularidades no processo e declarando ter vencido o pleito.
Momentos depois do anúncio, a principal líder da oposição, María Corina Machado, inabilitada para exercer cargos públicos e apoiadora de González, contestou o resultado.
“Ganhamos em todos os Estados do país e sabemos o que aconteceu hoje. Cem por cento das atas que o CNE transmitiu nós temos e toda essa informação aponta que Edmundo obteve 70% dos votos”, disse Machado a jornalistas.
Ela acrescentou avaliar que as supostas modificações feitas nos resultados haviam sido “grosseiras”.
O embate prenuncia mais tensão nas próximas horas e dias na Venezuela, sob acompanhamento dos países vizinhos e dos EUA.
O secretário de Estado americano, Antony Blinken, afirmou que seu país tem “sérias preocupações” sobre o resultado anunciado. “A comunidade internacional está observando isso de perto e responderá de acordo”, afirmou Blinken.
O presidente chileno, Gabriel Boric, questionou abertamente os resultados e disse que o Chile só reconhecerá números “verificáveis”.
Já Brasil, Colômbia e México – todos de governos à esquerda, como o de Boric – ainda não haviam se pronunciado até a publicação desta reportagem (leia mais abaixo).
O presidente Nicolás Maduro, de 61 anos, que dirige o país desde 2013, comemorou a vitória que lhe dará um terceiro mandato a partir de janeiro.
“Temos de respeitar o árbitro e que ninguém pretenda manchar essa jornada bonita”, disse o mandatário venezuelano.
‘Vigília’ nos centros eleitorais
Desde o encerramento das urnas – às 18h de Caracas (19h em Brasília) -, os dois principais nomes da oposição intensificaram os pedidos para que seus eleitores continuassem em “vigília” nos centros eleitorais.
María Corina Machado, que liderou a campanha transferindo seu apoio a González, um ex-diplomata de 74 anos, pediu que os oposicionistas atuando como fiscais exigissem atas de resultados nos centros de votação, citando que esse era um direito previsto em lei.
“Esses são minutos cruciais, horas decisivas”, disse Machado. “Precisamos que todos os venezuelanos permaneçam nos centro de votação acompanhando os observadores.”
Os apelos foram seguidos de denúncias de opositores sobre supostas irregularidades em centros de votação. Pouco antes do anúncio oficial, González disse no Twitter ter ganhado a disputa.
Desde 2013 a oposição não aparecia com tamanha possibilidade de derrotar o governo, segundo os analistas, apesar das denúncias de que o processo eleitoral não teve condições justas de competição.
Além da própria inabilitação de Machado, houve dificuldades para que os milhões de venezuelanos que estão no exterior por causa da longa crise econômica e política do país pudessem votar.
Reação e papel do Brasil, Colômbia e dos EUA
O processo eleitoral foi seguido de perto pelos países vizinhos e pelos EUA, mas teve uma reduzida participação de observadores internacionais, depois que o governo Maduro, que controla o CNE, retirou o convite para que uma missão da União Europeia acompanhasse o pleito.
“O regime de Maduro deve entender que os resultados que publica são difíceis de acreditar”, afirmou no X, antigo Twitter, enquanto aliados de Maduro como os governos da Bolívia e de Honduras felicitavam o presidente venezuelano.
Os presidentes de Brasil e Colômbia, países apontados por analistas como potenciais mediadores na situação venezuelana, permaneciam em silêncio sobre os resultados até a publicação deste texto. O México também não havia se manifestado.
Para acompanhar a disputa, o governo brasileiro enviou a Caracas Celso Amorim, ex-chanceler e influente assessor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para temas internacionais.
Na noite de domingo, Amorim divulgou nota celebrando que “a jornada tenha transcorrido com tranquilidade, sem incidentes de monta”, com “participação expressiva do eleitorado”.
“Estou em contato com diferentes forças políticas e analistas eleitorais, além de membros da equipe de observadores do Centro Carter e do Painel de Especialistas da ONU. O presidente Lula vem sendo informado ao longo do dia. Vamos aguardar os resultados finais e esperamos que sejam respeitados por todos os candidatos”, disse o ex-chanceler.
A declaração reforçou a mensagem de Brasília nos últimos dias de que o resultado, seja qual fosse, deveria ser respeitado.
Na última semana, Lula, um aliado do chavismo, marcou uma inusual distância do presidente venezuelano ao criticar a declaração de Maduro de que uma vitória da oposição levaria a “um banho de sangue”.
Enquanto isso, o libertário argentino Javier Milei, de aberta oposição a Maduro, se manifestou no X (antigo Twitter).
“Fora, ditador Maduro”, escreveu Milei em maiúsculas. “Os dados anunciam uma vitória acachapante”, seguiu, quando ainda não existiam resultados oficiais divulgados.
A vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, havia afirmado no início da noite que a “vontade do povo venezuelano deve ser respeitada”.
Ainda antes do resultado, Kamala, que será possivelmente a rival de Trump nas eleições deste ano, defendeu um “futuro mais democrático”, sem mencionar nomes.
O papel que terá os EUA é um aspecto aguardado, já que Washington mantém sanções à indústria petrolífera venezuelana para punir o governo Maduro.
Sob pressão da Guerra da Ucrânia e para incentivar o processo eleitoral da Venezuela, a Casa Branca afrouxou as sanções por alguns meses em 2023, após um acordo que prometia a participação da oposição nas eleições.
Como o CNE impediu María Corina Machado de concorrer, a redução das sanções foi revertida.
Logo após o anúncio dos resultados feito pelo CNE, o secretário de Estado dos Estados Unidos, Antony Blinken, afirmou que seu país tem “sérias preocupações” sobre o resultado anunciado.
Blinken disse também que os EUA estavam preocupados com o fato de o resultado não refletir nem a vontade e nem os votos dos venezuelanos.
“É fundamental que todos os votos sejam contados de forma justa e transparente, que as autoridades eleitorais partilhem imediatamente informações com a oposição e observadores independentes e sem demora e que as autoridades eleitorais publiquem a apuração dos votos. A comunidade internacional está observando isso de perto e responderá de acordo”, disse.
Como funciona o sistema eleitoral venezuelano?
Um dos grandes temas a partir de agora será uma possível auditoria dos resultados.
Na Venezuela, o sistema de votação é eletrônico, mas há diferenças em relação ao brasileiro.
Ao chegar ao local de votação, o eleitor apresenta o documento, que é registrado no sistema. Depois, por meio da biometria, é feita a autenticação e a urna eletrônica é liberada para que ele vote.
As fotos dos candidatos aparecem na tela. No entanto, o sistema indica os candidatos apoiados por cada partido. Quanto mais apoios tiver, mais fotos aparecerão. Assim, Maduro apareceu 13 vezes. González, três.
Depois de votar, o sistema imprime o voto e o eleitor o coloca em uma urna. Após a votação, os fiscais comparam os resultados das urnas eletrônicas com os do papel. Cada urna também imprime uma ata, cópia dos dados a serem enviados ao CNE.
Pouco depois do anúncio feito pelo CNE, o chanceler venezuelano, Yvan Gil, divulgou uma nota dizendo que seu país estava denunciando e alertando ao mundo sobre “uma operação de intervenção contra o processo eleitoral.”
Colaborou Marina Rossi, da BBC News em São Paulo