Morte de cão Joca impulsiona regulamentação de animais no avião
O Fantástico deste domingo (28) exibiu, com exclusividade, as últimas imagens conhecidas onde o cão Joca, da raça golden retriever, aparece com vida antes de embarcar de Fortaleza para São Paulo. O pet deveria ter sido levado do Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, para Sinop (MT), mas foi colocado num avião que embarcou para Fortaleza (CE).
Ao percebe o erro, a companhia aérea acabou mandado o animal de volta para Guarulhos e, quando o tutor chegou para encontrá-lo, o cão estava morto.
“Quando eu cheguei em Sinop, uma responsável da Gol me ligou e falou que teve um erro. Que eles colocaram o cachorro em outro voo que foi para Fortaleza”, conta João Fantazzini, tutor de Joca.
A companhia disponibilizou uma passagem para João voltar para Guarulhos e encontrar seu cão. O problema, é que com essa logística, o cão passaria praticamente dez horas trancado em uma caixa.
As imagens obtidas pelo Fantástico mostram o cachorro em solo cearense. Depois do pouso do avião, ele passa pelo carrinho dentro da caixa de transporte e está a caminho do outro avião, para voltar para São Paulo.
“Depois o Renato, eu não sei quem é esse Renato, começou a mandar fotos para mim. Falando que a companhia recebeu o Joca em Fortaleza, que ele estava bem e estava recebendo água”, conta João.
No vídeo, é possível ver uma pessoa interagindo com o cão, dentro da caixa.
“Pronto ó. Cachorrinho, tranquilo, tem água. Menino do papai, bebê. Tá tranquilinho, bonitinho. Tá bom? Vai retornar lá para Guarulhos”, diz uma funcionária que aparece com Joca.
Quando o relógio marca 12h38, o avião com Joca começa a sair de Fortaleza. O que aconteceu depois, o Brasil inteiro ficou sabendo.
“Aí eu o vi morto. Eu lembro que passei a mão nele, ele estava molhado”, diz João, chorando.
O tutor conta que Joca tinha cinco anos e era saudável e feliz. Por que Joca saiu vivo e foi entregue sem vida ao João? Essa é a pergunta que dois delegados tentam responder.
Antônio Carlos Desgualdo é o delegado de Guarulhos. Ao Fantástico, ele diz que é a primeira vez que se depara com um caso de tanta repercussão.
“Nós passamos de uma fase em que o animal simplesmente era visto como um objeto, como uma propriedade”, diz.
Em Fortaleza, a polícia já ouviu informalmente cinco testemunhas. O delegado da polícia cearense Wilson Camelo explica que ele ficou 40 minutos em solo cearense e que a investigação tenta elucidar se ele foi tirado da caixa em algum momento.
“O tempo que ele ficou aqui em Fortaleza foi esse, de aproximadamente 40 minutos. Vamos confirmar essa linha de investigação com os depoimentos que ainda serão colhidos na próxima semana”, diz.
O delegado confirma que o cachorro estava vivo quando foi colocado dentro do avião que seguiria para São Paulo.
A suspeita é de Joca tenha tido uma parada cardiorrespiratória por conta do calor.
“Pelo fato de ter salivação no entorno, pode ser que houve ali realmente um caso de hipertermia, que é o calor excessivo. Mas a necrópsia vai conseguir elucidar isso”, diz a veterinária que deu o laudo.
A veterinária Rira Ericson viu as imagens de Joca em Fortaleza, antes de morrer no voo para São Paulo. Segundo a especialista, nesses casos, o ideal seria ter um controle mais preciso de temperatura.
“O ideal realmente seria a gente ter um controle de climatização ou até mesmo um termômetro dentro da caixa. E no mundo ideal, a gente teria um ser humano o tempo inteiro acompanhando a carga viva, porque podem ter variações, tanto de temperatura, como de comportamento”, diz.
Caixa com identificação errada
A caixa de transporte em que Joca foi colocado era da própria companhia aérea. O tutor do pet diz que pagou R$ 2.400 pelo transporte e que nem identificação correta tinha.
“Quando a caixa chegou com ele, viram que tinha etiquetas de outras cidades na caixa, para um cachorro de 13 quilos que não era do Joca. E essa etiqueta aqui, que é verde, está escrito “conteúdo Chiara”, estava em todos os lados da caixa. Então, eles não se atentam nem para saber o nome dele”, desabafa.
João relata que não tinha nenhuma etiqueta com o nome de Joca.
Essa não é a primeira vez que companhias áreas comentem erros durante o transporte de animais. O Fantástico mesmo já contou as histórias da Mel, do Tol, do Zyon, da Pandora e, agora, do Joca.
🐕 Mel, 2015: um cão caramelo saiu de São Paulo, rumo a Salvador, e sumiu. Uma funcionária da TAM, na época, chegou a oferecer outro cachorro para a tutora;
🐕 Tom, 2019: o cachorro embarcou de São Paulo para Vitória e foi entregue morto para Davi;
🐕 Zyon, 2021: o filhote voava de São Paulo ao Rio e morreu horas após o desembarque. Nos laudos, consataram hipertemia, e uma das causas é a exposição ao calor;
🐕 Pandora, 2021: a cachorrinha que ficou famosa no Brasil após fugir numa conexão em São Paulo. Ela foi localizada na área do aeroporto 45 dias depois.
Regulamentação do transporte de animais vivos
A advogada especializada no assunto Antília Reis diz que tem nove casos de pessoas que transportaram animais em aviões e que tiveram um transporte inadequado.
“Agora é chegada a hora de falar basta. Tem que ter uma regulamentação”, diz.
O ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, diz que a ideia é ter um protocolo único no Brasil.
“Uma das ideias que surgiu é da possibilidade do rastreamento dentro do transporte animal. Eu acho que essa questão que aconteceu com o Joca, com cão, vai servir de um marco regulatório para a gente poder avançar na direção de uma política de segurança permanente”, diz.
No Brasil, em 2023, 80 mil pets viajaram de avião. Nove em cada dez vão na cabine, segundo a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear). Segundo Rita, o ideal é que se tenha um veterinário responsável em cada aeroporto.
A demanda foi feita em 2021 pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária.
João, o tutor de Joca, diz que irá lutar por Justiça. “Eu vou lutar pelo Joca para que nenhum cachorro mais passe por isso. Ele vai ser lembrado por conta disso”.
A Gol não quis gravar entrevista. Em nota, a empresa disse que “Até que o processo de investigação possa dar as respostas para melhorar controles e rever processos, tomamos a decisão imediata de suspender a prestação do serviço.
A empresa pede “desculpas pelo acontecimento no caso do cachorro Joca” e diz que “não transporta animais como bagagens”.