A “banheira de gelo” é uma das curiosidades da vida de um atleta de alto rendimento e vira e mexe rende assunto na web. Mas você sabia que a prática também é adotada para os cavalos que participam das provas de saltos do hipismo, modalidade que estreia na manhã desta segunda-feira (29) nos Jogos Olímpicos de Paris?
Thalita Olsen de Almeida, proprietária da égua olímpica Miss Blue-Saint Blue Farm, de 11 anos, e a manager Louise Mansur, explicam à GQ Brasil que a técnica é diferente quando envolve os animais. Ao invés de ficarem inteiramente submersos, eles vestem “botas” que vão até a altura da dobra da perna (as chamadas bolsas de gelo ou spa boots). A solução colocada lá dentro é composta de 80% de água e 20% de gelo.
Uma seção de banho gelado é feita geralmente dentro do box onde a animal repousa entre provas, sempre após os saltos (seja em treino, seja em competição), e dura 20 min para cada par de pata. Evitar colocar todas as patas da égua é uma cautela para não assustá-la durante o procedimento.
“A Miss Blue faz (a terapia de gelo) desde que começou a saltar nas provas mais altas, quando tinha 7 anos de idade”, explica a dupla. “Ela já pulava 1,35 metro de altura”. A prática é comum entre outros times: Fedarman B, cavalo do estadunidense Boyd Martin, por exemplo, viajou da Pennsylvania a Paris levando sua própria bota de gelo. Neste traslado, costuma também haver uma preocupação com a recuperação do animal, com direito a uma bebida eletrolítica para hidratação.
Após conquistarem o título de Campeões do Grand Prix Longines de Hamburgo em maio, na Alemanha, a égua e seu cavaleiro, Yuri Mansur, estão entre as promessas de medalha do Time Brasil. A classificatória da modalidade acontece às 6h, horário de Brasília, no Palácio de Versalhes, em Paris.
Para que serve o banho de gelo?
Não se trata só de uma estratégia para espantar a onda de calor parisiense. Assim como no caso de atletas humanos, a crioterapia tem a função de acelerar a recuperação dos músculos após uma prova. O banho de gelo contrai os vasos sanguíneos e diminui a atividade metabólica, reduzindo inchaços e lesões, e preparando o corpo para novos exercícios.
Os saltos naturalmente exigem do organismo do cavalo, e no caso da Miss Blue, o time tenta minimizar este stress físico para além dos equipamentos como o spa boot. “A gente conduziu ela de uma forma muito diferente que os cavalos geralmente são conduzidos”, diz Thalita. “Ela pula pouco, mas faz muita ginástica e trabalho plano – quando se trota, se galopa, se flexiona, você vai mostrando as coisas pro animal. Ela é uma atleta também, então as lesões podem acontecer.”
“Os nossos cavalos do hipismo têm um staff de 15, 20 pessoas. Eles têm spa, o cavalo tem uma máquina magnética para fazer relaxamento muscular, tem dentista“, lista a proprietária. Sobre a égua em Paris, a alimentação também é cuidadosa: “fervemos o feno dela em uma máquina para esterilizar.”
Miss Blue, por sinal, sofre de dermatite quartela, inflamação bacteriana causada pela serragem do pasto. O shampoo que ela usa para aliviar os sintomas foi especialmente desenvolvido pelo dermatologista Dr. Guilherme Olsen de Almeida – que, curiosamente, também cuida da pele de seu cavaleiro, Yuri Mansur.
Mudanças para Paris
Todo esse universo de cuidados se relaciona a um momento de escrutínio com a chegada de um evento global como os Jogos Olímpicos. No último dia 19, a Fédération Équestre Internationale (FEI), que regulamenta o hipismo durante a competição, anunciou uma iniciativa em prol do bem estar dos cavalos que irão competir em Paris – a obrigação de descanso adequado após provas, por exemplo, é uma das normas fundamentais, de acordo com a Federação.
A mesma iniciativa prevê pela primeira vez em uma Olimpíada a figura de um Coordenador de Bem Estar Equestre, cujo trabalho é analisar o trabalho das equipes olímpicos no trato com os animais através do auxílio de uma equipe veterinária. Até então, as responsabilidades dessa operação eram divididas entre um grupo de juízes, médicos veterinários e membros do júri em solo, que arbitram sobre casos in loco.