A política só pode ser a arte de ocupar todos os espaços disponíveis em qualquer momento ou situação. Há quem espere que nas tragédias o comportamento seja diferente, como se fosse possível ou obrigatório suspender o jogo normal em nome de algo maior, com a prática momentânea de uma espécie de etiqueta moral. Durante as grandes enchentes que devastam o Rio Grande do Sul, diferentemente dessa expectativa de moratória político-partidária, o que se vê é o recrudescimento das estratégias de sempre. A extrema direita empenha-se em espalhar notícias falsas para tentar abalar a credibilidade do governo federal na ajuda a um Estado combalido. A direita mais moderada desespera-se em busca de falhas na ação presidencial.
E a esquerda? Faz tudo certo? Certamente que não. A indicação do competente Paulo Pimenta, deputado federal petista, ministro da Secretaria da Comunicação, o homem de Lula, no Rio Grande do Sul, tem dado o que falar. Afinal, Pimenta é tido como candidato natural à sucessão de Eduardo Leite em 2026. Adeptos da ideia de paralisação do campeonato político se perguntam: por que não o senador Paulo Paim, de Canoas, um dos epicentros do drama, que garante não ser mais candidato, homem de diálogo, capaz de conversar com todo mundo? Por que não um técnico? Por que não o ex-deputado Henrique Fontana, que já não ambiciona estar sob a luz dos holofotes? Meu amigo Dominique Wolton, sociólogo francês acostumado a analisar estratégias partidárias, me diz que a direita não tem moral para cobrar coisas assim, pois, quando pode, age da mesma maneira sem o menor pudor.
O observador antiquado questiona: terá Lula apenas escolhido aquele em quem mais confia? Ou terá aproveitado para impulsionar desde já a candidatura do indicado? Eduardo Leite detestou a indicação. Segundo a mídia, ele teme um governo paralelo. Pimenta terá o poder de controlar o caminho dos milhões liberados pelo governo federal. Quem teria Bolsonaro escolhido se ainda estivesse no poder? Bibo Nunes? Político nunca descansa da política. A direita logo defendeu que não era o momento de apontar culpados. A esquerda contra-atacou sustentando que nunca se teve um momento tão apropriado. As falhas são tantas que a afirmação parece inquestionável. Por trás estará somente a oportunidade de fragilizar o adversário para a eleição de outubro?
A mídia dominante de Porto Alegre chegou a apontar falhas da administração municipal. Em seguida, corrigiu o rumo e passou a apresentar Sebastião Melo como três vezes vítima da enchente. Depois, diante das clamorosas negligências da prefeitura, deu nome aos bois. Sebastião Melo não fez o dever de casa. Lula veio acertadamente três vezes ao Rio Grande do Sul. Libera recursos para a reconstrução do Estado com rapidez e generosidade. Derrapa, às vezes, em falas eleitoreiras ou autoelogiosas inadequadas. O observador independente olha tudo com tristeza, sabendo que desagradará a todos. Nem a chuva, nem as catástrofes e nem o céu desabando, nada vai fazer a politicagem parar. Não é a política que deve parar, mas a sua patologia calculista. Enfim, como dizem os convictos, tudo é política. Até amor de mãe?
Até agora constatamos que os culpados não querem que os culpados sejam apontados. Consideram essa possibilidade como inconveniente.