O Brasil gerou 719 mil vagas de trabalho formais no primeiro trimestre deste ano e a taxa de desemprego caiu a 7,9% – a menor para os primeiros três meses do ano desde 2014. Apesar disso, o percentual de trabalhadores informais no país manteve-se praticamente inalterado de 2023 para 2024: de 39% para 38,9%.
Os dados foram divulgados na terça-feira (30) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua.
Eles reforçam um cenário de resistência da informalidade no pais mesmo em momentos de crescimento da economia. Desde 2020, a taxa de desemprego, que chegou a quase 15% em 2021, caiu praticamente à metade. Já a taxa de informalidade variou um pouco para cima ou para baixo mas manteve-se sempre perto dos 39%.
A exceção foi registrada no início da pandemia do coronavírus, quando os informais, desprotegidos, foram mais afetados pelo desemprego e, matematicamente, acabaram reduzindo a 36,5% sua participação no mercado de trabalho nacional.
Hoje, existem cerca de 37,9 milhões de pessoas trabalhando com carteira assinada no setor privado, segundo o IBGE. Ao mesmo tempo, há cerca de 39 milhões de trabalhadores informais, sem direito a qualquer direito trabalhista no país.
Informais são aqueles empregados sem carteira assinada, o que limita o acesso a direitos como férias ou 13º salário, por exemplo; ou trabalhadores por conta própria que não contribuem para a Previdência Social e, por isso, podem ficar sem aposentadoria.
“A informalidade é um problema crônico do nosso mercado de trabalho e que se tornou mais complexo após a Reforma Trabalhista”, disse Fausto Augusto Junior, diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
Contexto mundial
Augusto Junior disse que a informalidade no Brasil é historicamente alta, como em outros países subdesenvolvidos. Na África do Sul, ela chega a 60%, lembrou.
O economista explicou que isso está ligado ao papel dos países mais pobres na economia mundial. “Nos países ricos, quando um empresário quer reduzir custos, ele investe em máquinas. Nos países pobres, esse investimento não acontece. Resta a retirada de direitos dos trabalhadores para tentar baratear a produção”, afirmou.
“No caso de uma economia periférica como a brasileira, a informalidade cria um exército de reserva de mão-de-obra que pode ser aproveitada em setores muito intensivos em trabalho, como é o caso da construção civil”, ratificou o economista André Roncaglia, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Reforma Trabalhista
A economista Juliane Furno, professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) e pesquisadora do Instituto Tricontinental, acrescentou que a essa realidade somaram-se a crise econômica iniciada em 2015 e a Reforma Trabalhista de 2017. Para Furno, tal reforma, na verdade, converteu um esforço por formalização em brecha para a precarização.
Segundo ela, a informalidade tinha caindo nos anos 2000 em parte pela criação do Microempreendedor Individual (MEI), em 2008. Isso mudou depois da reforma, que “legalizou vínculos anteriormente ilegais, como o trabalho autônomo com subordinação”.
“Aquilo que servia para, por exemplo, uma cabeleireira autônoma gozar dos direitos previdenciários, passou a servir para um trabalhador subordinado ser submetido a prestação de serviço a uma só empresa, só que sem vínculo”, disse.
“A informalidade aumentou não só pelas as crises econômicas, mas, sobretudo, porque foram possibilitados novos vínculos informais”, resumiu.
Solução
Para Mauricio Weiss, economista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), reduzir a informalidade no país não é tarefa fácil. A solução, contudo, não passa por novas flexibilizações na legislação trabalhista, na sua opinião.
“Isso já foi feito”, disse ele. “O fundamental é continuar com o crescimento econômico e políticas de fortalecimento da indústria, pois é um setor com encadeamentos para outras cadeias produtivas e que gera empregos formais.”
Weslley Cantelmo, economista e presidente do Instituto Economias e Planejamento, reforçou que políticas públicas que favoreçam a industrialização podem contribuir para uma melhoria dos empregos no país. Para ele, no entanto, não há sinais claros de que o país esteja empenhado neste sentido.
“Uma política de reestruturação produtiva no sentido da reindustrialização do país, em patamares tecnológicos avançados e condizentes com os desafios da crise ecológica, nos ajudaria a sair desta enrascada da informalidade. A má notícia é que estamos bem distantes de começar esse movimento de maneira efetiva”, disse.
Procurado pelo Brasil de Fato para comentar a informalidade no país, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) não se pronunciou.
Edição: Nicolau Soares